28-mai-2020

Projeto Órbitas Urbanas - ciclismo e ensino

bike luz

Quando alunos do Ensino Médio puderam conhecer a cidade através do pedal: Nossas Órbitas Urbanas.

O desafio neste texto será contar a todos como foi a experiência e o desafio de levarmos alunos de uma tradicional escola de São Paulo (o Colégio Marista Arquidiocesano) a se aventurarem conosco pelas ruas e avenidas da metrópole em busca de novos conhecimentos sobre a cidade, suas dinâmicas e desafios, mas ao mesmo tempo sobre cada um de nós, nossos limites, ousadias, medos, enfim...

Então, para começar, reproduzo abaixo as perguntas que nos levaram às 8 edições do Projeto Órbitas Urbanas (2011-2018), sendo que em 7 edições realizamos um passeio ciclístico com cerca de 100 alunos entre 15 e 16 anos, pelas ciclofaixas de lazer da cidade.

“De que matéria é feita a cidade? De que muros, medos, postes, pressas, luzes, dores, semáforos, crenças, prédios e sonhos somos todos nós feitos quando nos percebemos parte dela? Mas, afinal, será que conhecemos, de fato, o lugar onde habitamos? Será que podemos realmente nos apossar da cidade sem, ao menos, conhecê-la? O conhecimento sobre o lugar onde vivemos não seria também o conhecimento sobre nós mesmos?”

Desvelar a cidade, encantar-se com suas belezas, viver o cotidiano, indignar-se com suas contradições, mas, fundamentalmente, fazer parte dela e tornar-se, mesmo que momentaneamente, protagonista no processo de aprendizagem. Estes foram os desafios que buscamos atingir com o projeto Órbitas Urbanas. É claro que, para as pessoas que não são da área de educação, os objetivos podem parecer minúsculos. Mas, imaginem uma escola do tamanho do Arqui, com toda a sua representação simbólica e tradição, parando as aulas tradicionais durante uma semana, para que seus alunos da segunda série do ensino médio pudessem mergulhar na aventura de descobrir e viver intensamente a cidade? Pois é. Olhando nesta perspectiva não parece pouco. E realmente não foi.

Assim, após a primeira edição do projeto Órbitas Urbanas em 2011, comecei a pensar na ideia de realização de um passeio ciclístico que marcasse a abertura do projeto e fosse um aquecimento para os estudos que seriam realizados durante uma das semanas do mês de outubro, período em que realizávamos todas as atividades do projeto, fato que culminava num grande ato político, onde os alunos expunham os resultados de seus estudos, suas produções (culturais, artísticas, teórico-científicas) numa grande conversa coletiva com pessoas convidadas (normalmente políticos, acadêmicos e lideranças sociais). Bem, comecei a falar disso para esclarecer de onde surgiu a ideia do passeio ciclístico. Então, somente na 3ª edição do projeto (2013), ainda em caráter experimental, a coordenação do colégio, nas figuras do Laurindo Cisotto, Marisa Rosseto e da Kátia Helena toparam o desafio e levaram-no à direção da escola que, prontamente nos deu o sinal verde para a realização do evento. Vários professores também curtiram a proposta, mas todos estávamos com medo de levarmos os alunos à esta atividade. Ela seria realizada num domingo, sem a necessidade dos pais assinarem um documento de autorização, onde cada aluno se encarregaria de trazer sua bike (própria ou de algum serviço de empréstimo disponível à época), faríamos um percurso pelas ciclofaixas (Arqui-Domingos de Morais-Paulista-Vergueiro-Praça da Sé-Pátio do Colégio-Viaduto do Chá-Vergueiro-Domingos de Morais-Arqui) e, depois, tranquilamente, cada um voltaria à sua casa.

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Pensou na situação? Enquanto ciclistas, todos nós acharíamos a coisa mais normal do planeta. No entanto, enquanto escola, a organização, logística e alguma certeza de os riscos seriam muito pequenos era algo extremamente importantes para o sucesso da atividade e crescimento/fortalecimento do projeto e, ouso dizer, até para a manutenção de nossos empregos.

E o que seria do mundo e de cada um de nós sem um tanto de ousadia? Sem assumirmos alguns riscos? Pois é. Acho que não seria nada. Assim, começamos a tarefa de organização de uma das atividades que considero das mais desafiadoras e significativas no contexto do projeto Órbitas Urbanas, que foi o passeio ciclístico.

Estávamos em 2013 e, conforme já relatei num dos textos que publiquei, naquele ano eu já tinha realizado o Bike Luz e conhecido o Giovani e a Carolina Villa, ambos do Cicloativo. Assim, recorri primeiro aos amigos, antes da instituição, para que pudessem nos dar todo apoio logístico necessário à realização do evento. E, você já sabe como foi. Um amigo chamou o outro e, de repente, já tínhamos cerca de 15 ciclistas experientes para monitorar toda a atividade, sendo alguns deles integrantes do grupo que realizou o Bike Luz. Não vou lembrar o nome de todos, mas a gratidão pelo apoio será eterna. Então, em 2013 realizamos o 1º passeio ciclístico Marista-Órbitas Urbanas. Na primeira edição participaram 45 alunos que, num contexto de 210 ao todo, pode parecer uma baixa adesão, mas tratava-se da nossa primeira experiência. Em 2014 a adesão já foi bem maior. Cerca de 120 alunos participaram do 2º passeio ciclístico. Aí o ICB – Instituto Cicloativo do Brasil já havia se tornado parceiro da atividade e, a escola, em contrapartida, se tornava oficialmente parceira do Projeto Duas Rodas para o Natal.

Entre 2013 e 2018 realizamos 6 edições do passeio ciclístico. A atividade sempre foi muito bem avaliada pelos alunos/famílias, professores, coordenação e direção da escola. Ela sempre marcou a abertura do projeto e uma espécie de aquecimento dos estudos e, com certeza, os passeios ciclísticos sempre foram um exemplo de como é possível usufruirmos dos serviços disponíveis na metrópole (as ciclofaixas), de interação entre os integrantes dos grupos, de autoconhecimento, de teste dos limites, de aprendizado. Portanto, as bikes assumiam um protagonismo importante na experiência educativa e, por isso, minha gratidão a cada um dos participantes de cada edição do Projeto Órbitas Urbanas e dos passeios ciclísticos, principalmente aos integrantes do ICB – Instituto Cicloativo do Brasil que sempre estiveram conosco. Aqui aproveito para fazer uma homenagem ao Dermê (Demerval de Oliveira Santos Filho) que esteve conosco algumas vezes e, infelizmente, foi vítima de um atropelamento enquanto treinava para uma prova de ciclismo em janeiro de 2018.

Para finalizar, fica a dica de que é possível realizarmos essas atividades com alunos das mais diferentes escolas da cidade. No meu caso eram alunos de classe média de uma escola tradicional. Mas, é possível sonharmos com mais gente pedalando pela cidade, conhecendo suas histórias, vivendo suas dinâmicas e quiçá, projetando a cidade, o transporte e a qualidade de vida que queremos para nós e as futuras gerações.

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Por Profº Paulo Mendes, ciclista urbano, bacharel e licenciado em Geografia pela PUC/SP e voluntário do Instituto Cicloativo do Brasil.



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